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sábado, 11 de janeiro de 2014

MINHA VÓ INÁCIA E AS BONECAS DANÇARINAS

No baú de minha vó, havia bonecas dançarinas. Ela estava com uma idade bastante avançada e o vestido preto e o lenço também preto a fazia mais idosa ainda. Levantava depois de servido o café  e ela mesma trazia os utensílios para ser lavados por minha mãe. Descia uma escada com degraus altos com ajuda de um bordão. Tinha que esperar o momento certo, para que ela quisesse abrir o encantado baú. Cuidadosa, minhas bonequinhas de louça desapareciam e eu levava um susto quando encontrava deitadinhas sobre as roupas dobradas no baú. Que bom! Pareciam novas e parecia Natal de novo. Quero falar das bonequinhas feitas por minha avó: foram feitas de forma que eu não sei explicar na sua totalidade, a saia de armação da dançarina, de apenas dez centímetros, era de cauda de cavalo que costurada numa cortiça formava um círculo perfeito. Sobre esta primeira armação vinha uma saia que a largura inferior coincidia com o círculo já confecionado.  A parte superior era feito  de pano branco e as meninas tinham cabeleira e pintadas de ruge. Uma blusinha completava a vestimenta. Meia dúzia de bonequinhas eram levadas com carinho  e colocadas sobre a mesa do jantar e ali ela batia e elas deslizavam. Durante a minha vida não me deparei com outra pessoa que fizesse bonequinhas dançarinas, iguais as dá vó Inácia.



segunda-feira, 15 de novembro de 2010

MINHA VÓ IGNÁCIA E SANTA CATARINA DE SENA

                                                    Muito devota de todos os santos, minha vó, tinha santinhos de todos os cantos da terra, por onde fora canonizado algum. Ela tinha a estampinha e a oração. Pedia para que ela abrisse o baú e me  mostrasse os anginhos que ela tinha guardado, com aqueles rostinhos redondos, rosados e olhinhos azuis. Tinha também suas preferências. Era devota de Santa Catarina de Sena. Uma religiosa da Ordem Terceira de São Domingos. Pedia a Santa Catarina que curasse gripes e todo tipo de peste que poderia estar pela terra. Fazia o sinal da cruz, beijava a foto da santinha, rezava com muita fé e guardava novamente no baú. Contava minha vó que esta santa tinha seguidores por toda parte, porque ela havia pacificado, havia falado com Jesus e ela tinha ditado muitas cartas que levaram a todos a união e a fé. Disse que uma madre religiosa havia construído um convento o maior do mundo, (há um outro convento, também muito grande) que todos os habitantes da cidade trabalharam de sol a sol para terminar a tal obra e que se chamava o Mosteiro de Santa Catarina. E esta devoção se espalhou pela America do Sul trazida pelos padres missionários.
      Muitos anos depois passando por Arequipa, desgarrei-me do grupo, e visitei o mosteiro que fica próximo do Hotel e  da Praça das Armas .Minha vó estava certa. As notícias correram Andes abaixo. A obra é monumental. Chama-se Monasterio de Santa Catalina. Pasmem, pena que vovó já não era mais viva, para contar-lhes  o que vi.
      A religiosa era viúva de dom Diogo de Mendonça,  muito rica chamada dona Maria de Guzmán. Mandou construir o convento sob a égide de Santa Catarina de Sena, e sob os ensinamentos de São Domingos, ou seja as freiras dominicanas.  Entraram para o convento as moças ricas de Arequipa e arredores que recebiam dotes mensais dos pais, alguns até proprietários de minas (alguém me falou em minas de ouro).
     As paredes do convento são de  pedra tem a espessura de meio metro, para aguentar o frio dos Andes e possíveis terremotos. A arquitetura é belíssima. Uma cidadela com inúmeras ruelas, jardins internos e fonte.  Cada religiosa tinha o seu apartamento completo. Impressiona o forno e fogão a lenha juntos nos apartamentos, com uma escrava para cada uma, que deveria fazer pães e vender  para a população pela janela. A louçaria era de porcelana inglesa com desenhos pintados a ouro. A prataria também fazia parte. O mobiliário está completo. O guia apontou para um quadro. Um quadro pintado a óleo chamava atenção pela perfeição da pintura dos olhos,  os olhos nos seguiam para qualquer lado que íamos. Caminhei de um lado para outro para me certificar do que estava vendo. Lembrei-me então das aulas do ginásio, onde a  irmã Regina (prof. do ginásio)  havia falado desse quadro. Os ricos espanhóis trouxeram para o Peru pintores de Sevilha para pintar e ensinar, no caso, mais parece uma obra de grande pintor. Em Porto Alegre, numa exposição, vi o auto-retrato de Sarah Bernad que, também  me impressionou. As escravas dormiam quase ao relento, numa cama de pedra com cimento e sem colchão. O quarto mal dava para entrar,  apenas uma abertura de porta que dá para as ruelas centrais com uma cortina servindo de porta.  A  temperatura chega abaixo de  zero graus, a uma altitude 2.378 metros.  A cidadela possui 20.400 metros quadrados. Viveram ali entre religiosas e leigos aproximadamente 500 pessoas. Eles não sabem ao certo o motivo da grandeza da obra. Poderia ter servido de esconderijo ou por motivos de terremotos. Não sabem, também o que se passou  dentro do convento. Tombado pela UNESCO, é o único mosteiro  formando uma cidadela no mundo. Paga-se para se fazer a visita. As recepcionistas mais parecem umas aeromoças. Recebem a todos com muita elegância e perguntam logo em qual idioma se quer que o  guia lhe dê as explicações. Certa de que não falariam a minha língua, disse arranhando em francês que era brasileira e queria um guia que falasse português. A minha solicitação não foi contemplada, como eu previ. Sorrimos. Na entrada estava a foto da madre, num quadro mandado fazer por um Papa, no qual ele fez questão que colocasse na cabeça da diretora, as aspas do demônio.  Eu vi e não pude fotografar, porque não havia levado flash. Há também quem diga que a madre foi beatificada pelo Papa João Paulo II, pois o demônio fez um milagre e substituiram as guampas da freira por rosas, mas a cara de diabo continua lá. Se passar por Arequipa, confira.