domingo, 27 de janeiro de 2013

TRAGÉDIA E A IRREPONSABILIDADE

Aconselha Maquiavel: "Deve, sobretudo, abster-se dos bens alheios, posto que os homens esquecem mais rapidamente a morte do pai do que a perda do patrimônio". (O príncipe, p. 65). Tanto no Brasil como fora dele o dinheiro vale mais que as pessoas, mas abrimos exceções para àquelas que o possuem e não perdem a humildade, o que é raro...

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

FAMÍLIA BAUER - Sítio dos meus avós

                                 Primeiro capítulo
Pela passagem da data da Semana do Imigrante,  não pude deixar de pensar nos meus avós, descendentes de imigrantes alemães. Meus irmãos, tanto o Adroaldo como o Hermes, trabalharam nesta pesquisa por um longo tempo. Não foi fácil chegar aos arquivos, ora aqui, ora acolá para localizar lançamentos muitas vezes verdadeiros heriógrafos, mas com ajuda também de terceiros, a  origem da nossa família Bauer, foi desvendada. Na época da minha participação no concurso realizado pelo Correio do Povo e pelas Lojas Quero-Quero não pude lançar mãos destes dados, mesmo assim enviei a minha crônica. Começo a genealogia pelo meu primeiro parente vindo do estado da Renânia-Palatinado, Peter Jacob Bauer, do município Becherbach, cidade com o mesmo nome que fica no distrito de Bad Kreuznack. Cidade de poucos habitantes, que vivem até os dias de hoje da agricultura familiar e do turismo. Este município fica no Planalto  de Hunsrück,  uma serra de montanhas baixas, localizado no sudoeste da Alemanha, cercada pelos vales do rio Moselle, no Norte, do rio Nahe, ao Sul, e do rio Reno, no Leste. Este planalto é um pedaço do Planalto dos Hunus e portanto um povo de origem huna. Ainda outros povos por deixaram ascendentes como judaicos, alemânicos, romanos e desde que o imigrante fosse nativo da região e mesmo assim a Alemanha sofria a pressão de muitas línguas e muitos povos, principalmente nesta região, a língua francesa, por exemplo, atravessava até a Rússia. Os judeus Na chegada no Brasil, a distinção era feita pelos falares dos imigrantes, sendo que alguns eram professores, letrados e profissionais mais graduados, como também chegaram em número menor, alguns agricultores. A linguagem oral portuguesa foi simplificada. Talvez, apenas um verbo resolveria parte do sofrimento. Conjugá-lo seria impossível. Assim aprendiam o substantivo: barba, pé, cama, casa e um único verbo no infinitivo dava conta do recado. Assim surgiu: fazer a barba, fazer o pé, fazer a cama, fazer a casa. Peter, nasceu em 1788 e chegou ao Rio de Janeiro em 1825 e de lá para São Leopoldo em 1826 e nesta mesma data para a Colônia de São Pedro, distrito do município de Torres. Meu bisavô era filho de Josef Bauer, que era filho de Peter, meu tataravô ou meu tetravô, sendo eu Maria de Lourdes Cardoso, sua tataraneta, ficando em quinta geração, no grau de parentesco. O avô de minha mãe, era Gabriel José Bauer e o meu avô era Manoel Gabriel Bauer que se casou com minha avó Maria Margarida Clezar e minha mãe chamava-se Margarida Maria Bauer. Uma antítese francesa relacinada com o dinheiro e a terra me fez lembrar a partida de Peter e seus compatriotas da Alemanha: "Nulle terre sans seigneur y l'argent n'pas de maître". Pode-se traduzir em qualquer ordem: "Nenhuma terra ou terra de ninguém, sem senhor", significando o poder feudal com as terras vinculadas aos nobres, barões e a burguesia que se formava. O senhor era a pessoa responsável pelo feudo. A outra: "o dinheiro não tem dono", significando o dinheiro nas mãos dos poderosos que de posse do capital adquirem mais terras. Este contraste entre o poder da terra concentrada nas mãos da burguesia e o poder impessoal do dinheiro, que em última análise não pertence a ninguém é o que expressa a antítese. Esta desigualdade foi denunciada por escritores como Tolstóy (Rússia), Victor Hugo e Émile Zola (França) e pelos próprios alemães.

                                     "Adeus, pátria mal agradecida
                                       Vamos para outra terra,
                                       Vamos para o Brasil,
                                       Deixamos apenas as dívidas,
                                       Procuramos uma nova praia
                                       Lá procuramos o ouro como areia.
                                       Viva, viva,
                                       Logo estaremos no Brasil".

Esta letra de uma cantoria, refrere-se as dívidas. Era tudo que o trabalhador possuia naquela época por toda a Europa e a Alemanha estava entre àqueles países, de menor crescimento social e estabilidade como nação. A carga horária de trabalho era superior 12 horas por dia em troca de comida e vestes nas terras alheias, que ainda eram cobradas. Muitos eram mineiros e não tinham salário. Recebiam o dinheiro com uma mão e saia pela outra para o patrão.  A corrupção na Alemanha não dava tréguas, logo os mais jovens partiram, todos trabalhadores e de famílias honradas.  Peter Jacob Bauer completava onze anos, quando Napoleão assumia como Imperador da França e deixa o poder quando Peter tinha 27 anos. Não teve alemão que este Imperador, não tenha azedado. A Alemanha não havia se unificado e Peter já havia deixado aquela terra hóstil quando em 1848, nova revolução acontece entre seus iguais. Reunidos em assembléia em Frankfurt, se perguntavam até de forma desconcertante: Quem é o alemão? Onde está a Alemanha? Peter, já estava longe. Com a independência do Brasil em 1822, cresceu no novo Império a necesssidade de expandir a região sul que estava precisando de que fosse povoado, porque aqui havia um imenso vazio. A escolha recaiu sobre os alemães porque os portugueses já haviam sido rechaçados, assim aqui chegaram os primeiros alemães em 1824 até 1830, num total de mais de 5300. Escreve Friedrich Nietzsche em 1888, tendo como a Alemanha sua terra natal: "(...) o clima alemão por si só basta para enfraquecer vísceras fortes e até predispostas ao heroísmo." (Ecce Homo, p. 34). Meu avô Manoel e minha avó Maria Margarida (dindinha Cota), estabeleceram-se em terras de Barro Cortado que se estendia da estrada até o rio Mampituba. A casa fica numa elevada e a água vinha da sanga que passa abaixo da colina, trazida em porongos. Junto da casa, aos fundos o engenho de farinha de mandioca, uma tafona, que além da mandioca, plantavam o  milho, o feijão, cana-de-açúcar, batata-doce, batata-cará, aipim e chuchu. A horta na lateral da casa fornecia a couve, a cebolinha, salsa, e todos os chás necessários. Havia a gengibre, mastruço com cachaça para dores externas e flores de calda-mão. Rosas pendendes na cerca, dálias, zabumbas, e caetés eram as flores cultivadas na época. Dando continuação a horta, havia o pomar. O taguaral era necessário para o abrigo dos ventos, para cercas, balaios. Dindinha  era responsável pela criação de patos, galinha-de-angola e os peruzinhos eram alimentados com cupim e não faltavam netos para ver a festa dos bichos e a corte dos perus. Havia a criação de porcos, a vaca leiteira, o cavalo e as juntas de bois. Colhia-se o café. No pilão se socava  milho para os pintos. Não faltava a cangica, a araruta para os mingaus, para engomar toalhas e rendas, todas brancas. Uma vez por mês o vigário vinha para rezar a missa, algum batizado. No quarto do padre havia uma pequena mesa sempre arrumada de toalha de renda, a cama era de casal e de colchão afofado com palha de milho rasgada, com lençóes de algodão clareados, e colcha de renda da casa. Havia os acolchoados feitos de algodão, produzidos alí e os cobertores de lã de ovelha para o inverno e mantas de tiras de tecidos para meia estação. A frente da casa era verdinha, belo gramado para o cavalo, era roçada à foice. Havia jurubeba, arrebenta cavalo, com um fruto amarelo envolto em espinhos, era o juá e dava uma única fruta por pé (não se come). E as dróseras, o que era aquilo? Assistíamos nosso tio Pedro arrancar folhas de gerivá para os animais e alimentá-los com mandioca.  Cocos secos eram quebrados com pedras, para nosso divertimento. Para qualquer lado que se caminhava dava-se na baixada do terreno, com vertentes, tanto que a entrada do sítio costeava a coxilha em forma de meia lua e avistávamos ao Sul a cancela, longe. Em época de chuva o brejo aumentava, verdejante com araçás, e uma frutinha roxa que chamámos de mixirica, era colhida e chegávamos em casa de língua roxa. Com a ripa do gerivá fazíamos canoas para descer a rampa. Uma florzinha seca abria na baixada  e ali eu ficava de tufos em tufos para não atolar, para colhê-las. Tanto a baixada quanto o alto da colina me fascinava. Cruzar o banhado e chegar a cancela que dava para o Nordeste era tarefa difícil para mim, mas ficava com vontade de passar para a segunda margem do lado de lá, ali havia um gramado estreito com cerca para o gado não passar. Era deste lado de cima, depois da cerca, que ficavam as roças, a lenha, às margens do rio Mampituba, com pescarias. Não morávamos lá, mas no rigor do inverno era feito a farinha, o sabão,  e o polvilho. A madioca era raspada na madrugada e jogada em tangues para a lavagem e posteriormente ralada. Um boi ajudava a tocar as pás da parte superior da fornalha,  caminhando em círculo com os olhos vendados, percorrer o trajeto do boi também era divertido e se dependurar no cabo que prendia a cangalha ao torno central, era uma aventura. Nossos tios sempre atento porque uma queda significava ser pisoteado pelo boi com antrolhos. Um som emitido, lembrando um /ôôa/ o boi estacava. A fornalha era alimentada por forte fogo e assim a farinha ficava seca, no forno, depois de curtida, era colocado em tipitis, palavra indígena que significa cesto. Todos eram fabricados ali, bem como todos os balaios para transportar a mandioca feitos de cipó ou taquara e as peneiras. Minha mãe forrava o tipiti com folhas de bananeira de certa forma que a mandioca ralada não passasse sobre as frestas e era coberto com as próprias folhas. Missão quase impossível, diferenciar a fabricação do polvilho e de outros tantos a ser realizado num prazo limitado. A mandioca ralada era deixada de molho, enquanto brincávamos com as canoas de gerivá, o polvilho já estava secando e bandos de pássaros pousavam ali.  A madioca inteira  era apodrecida e ficava de cor azulada, coisa de assutar chinês que come ovo podre, dali saia o pão apodrecido, (ninguém faça isto). Havia o pão de milho sem fermento com apenas uma pitada de sal que depois de assado era cortado ao meio e torrado. Comía-se de colher depois de açucarado e jogado água fervente em cima. Os cuscuz eram colocados em latões, aquiridos em  Torres,  eram latas altas e finas, roscas de polvilho torradas, pão-ló-torrado e muitas bolachas e rosquetes eram aproveitados os momentos para ser feitos na temporada. Os bejus era feitos e comidos na hora, acompanhados de ovos, torresmo, morcilha ou linguiça. O porco já tinha sido sacrificado. Este era o café da hora do descanço, às 9 horas, depois de um trabalho de cinco horas, após um café bebido o que significava não haver nenhum acompanhamento. Os meus tios eram casados ali, e parentes e vizinhos que ficavam a quilômetros de distância iam chegando de carro de boi, carroça ou a cavalo. O padre na espreita, no quarto da noiva, a espera de casar, comer o assado e a cama refeita novamente para receber os singelos presentes. Um joguinho de chícaras de cafezinho chinesas, vendido por mascates, uma pecinha de porcelana, uma colcha de renda e só. A festa era no gramado, ali colocada a mesa com os assados, as roscas de polvilho e o vinho, após a cerimônia, pela tarde os doces e o vinho eram corridos em bandejas enfeitadas de papel crepom. As bolachas e os pães-de-ló eram cobertos de merengue e levados ao forno e enfeitados. As flores para enfeite das bandejas e doces levavam dias para ser confeccionadas eram guardadas em peneiras para o dia da festa. O gaiteiro já estava ali, e sala estava limpa, apenas um banco para não atrapalhar. O baile entrava noite à dentro e os convidados após o cansaço, botavam as crianças nas camas para dormir. Os homens jogavam cartas até clarear o dia, bem como o noivo participava das jogadas. Retiradas as cartas, farto café era servido no domingo para os convidados que sem pressa jogavam conversa fora. A ansiedade dos noivos e a sacanagem fazia parte do jogo. Distrair o noivo. O almoço de domingo era servido, já estava pronto, era o mesmo da festa de sábado. O cansaço dos noivos era visível, a curiosidade do quarto arrumado não saia do pensamento. As horas não passavam, bate duas, bate três, bate quatro. Nenhum convidado se mexe, melhor seria então, fazer a domingueira, voltar para a sala e dançar até escurecer. Aos poucos no final do dia os bois eram cangados, as carroças ajeitadas e os cavalos encilhados. E os noivos? Pobres noivos! Algum amigo convidava para seguir com eles, depois de juntar o pouco que tinham porque ali na frente dos pais, jamais e qualquer tentativa da noiva para ver os presentes era um estardalhaço. Lua-de-mel forçada. Não tenho dúvida somos descentes direto dos hunus. Só entrava naquele quarto o noivo. Viravam às costas com lágrimas, voltavam na época da colheita da mandioca, agora já com o primeiro filho, depois com o segundo, o terceiro e por aí...Voltamos muitas vezes lá,  tio Pedro iria se casar com  a tia Hermínia (única viva) e nós fazíamos perguntas sobre a noiva que não conhecíamos. Os tempos haviam mudado, brincava conosco e nos dizia bobagens, ríamos. A casa estava  arrumada, a festa era igual em todas as famílias, tudo era ainda repetido.  O campestre, ali tudo era campestre, o  mesmo de Becherbach, assim eram escolhidas as terras, a vista da colina da casa, a baixada  e a colina seguinte. A serra ao fundo, morros baixos na volta. Lá embaixo, as charnecas descritas por Emily Bronté, em Morro dos Ventos Uivantes e ali o vento também uivava.
Está previsto a continuidade dessa narrativa que vou considerar como sendo o 'Segundo capítulo'.


Pesquisa:
Pesquisador: Adroaldo Cardoso Duarte (irmão)
Pesquisador: Hermes Cardoso Duarte (irmão) com Blog familiabaueremtorres.blogspot.com
Foto: enviada por Arlindo Francisco Bauer (primo)
Blog: A Saga dos Alemães
Wikipédia, a enciclopédia livre.